Entrevista com Peter Atkins


Através das 7 perguntas capitais eu conheci o mundo, literalmente. Consegui conversar com pessoas que eu jamais imaginaria que seria possível. Foi um projeto incrível. São apenas 7 perguntas, mas que fornecem um pequeno mosaico da carreira e paixão do entrevistado (a) pelo cinema.

E hoje, com vocês o roteirista  Peter Atkins


1) É comum lembrarmos com carinho do início da nossa relação com o cinema. Os filmes ruins que nos marcaram, os cinemas frequentados (que hoje, provavelmente, estão fechados), as extintas locadoras de VHS e DVD que faziam parte do nosso cotidiano. Você é um apaixonado por cinema? Conte-nos um pouco de como é sua relação com a 7ª arte.

P.A.: Eu cresci em um tempo antes dos multiplexes. Todas as minhas primeiras experiências com filmes foram em veneráveis ​​cinemas de tela única, alguns palácios art déco da década de 1930, alguns auditórios convertidos ainda mais antigos. Eu também cresci antes do vídeo caseiro, então era importante ver um filme que você amava várias vezes nos cinemas, porque poderia ser sua única chance. Meus anos mais obsessivos foram quando eu tinha 12 e 13 anos: vi BONIE E CLYDE quatorze vezes, ERA UMA VEZ NO OESTE treze vezes, PLANETA DOS MACACOS onze vezes e 2001 quinze vezes.

2) Muitos adoram fazer listas de filmes preferidos. Outros julgam que é uma lista fluida. Para não te fazer enumerar vários filmes, nos diga qual o filme mais importante da sua vida.

P.A.: É uma pergunta difícil de responder. Com a ressalva usual de que a resposta de amanhã pode ser diferente, direi Orfeu, o filme de Jean Cocteau de 1950, que vi pela primeira vez em 1974. Escolho-o porque pode ter sido a primeira evidência perfeita para mim de que filmes de fantasia poderiam ser absolutamente alta arte, e essa alta arte poderia abraçar o capricho, a poesia e a fantasia sem minar sua profundidade. O filme de Cocteau é uma obra-prima que se recusa a se explicar por qualquer outro meio que não seu próprio mistério e esplendor.

3) O que o motivou a ser escritor? E o que foi mais desafiador: escrever um livro ou um roteiro?

P.A.: Eu tinha participado de companhias de teatro e bandas de rock desde a adolescência, então sempre 'criei', mas não escrevi prosa de ficção até completar trinta anos. Romances e roteiros são desafiadores de maneiras diferentes. Um roteiro médio tem apenas um terço das palavras de um romance médio, então de uma maneira muito simplista pode-se dizer que é um desafio intrinsecamente menos assustador, mas isso só é verdade se você considerar a matemática como uma medida de dificuldade artística.

4) Você foi membro fundador da "The Dog Company", um grupo de teatro de vanguarda dos anos 1970, junto com Clive Barker e Doug Bradley, com quem mais tarde trabalhou nos filmes Hellraiser. Como amigo de Barker, há alguma razão específica para você não ter trabalhado no primeiro Hellraiser?

P.A.: Clive escreveu e dirigiu o primeiro. Ele não precisava de ajuda! Além disso, eu tinha deixado a Dog Company vários anos antes para voltar para Liverpool e tocar na minha banda, The Chase, então eu não estava por perto.

M.V.: Mas ainda bem que voltou para o segundo, que muitos consideram o melhor da série, principalmente pelo roteiro.

5) Algumas profissões rendem histórias interessantes, curiosas e às vezes engraçadas. E certamente, quem trabalha com cinema, tem suas pérolas. Lembra-se de alguma história legal que tenha acontecido  durante a execução de algum trabalho seu e que possa compartilhar conosco? Alguma história de bastidores, por exemplo…

P.A.: Houve uma história engraçada justamente durante as filmagens de Hellraiser: Hellbound. Eu já disse isso algumas vezes antes em entrevistas, mas espero que seja novo para seus leitores. Estávamos em pós-produção no famoso Pinewood Studios nos arredores de Londres e Chris Figg, o produtor do filme, me pediu para dirigir uma sessão de gravação de ADR (Automated Dialog Replacement) com a atriz Clare Higgins, que interpretou Julia. Eu digo 'dirigir', como se eu pudesse dizer a essa soberba atriz qualquer coisa que ela ainda não soubesse. Então minha função rel era fazer companhia a ela durante a sessão, certificar-se de que os caras do áudio haviam preparado a filmagem certa para as falas que precisavam de regravação, segurar a mão dela nas partes chatas e pagar o seu almoço.

Normalmente, esse seria o trabalho do diretor, mas Tony esteva na Califórnia (ou algo assim) por um período breve. De qualquer forma, depois de algumas horas de trabalho pela manhã, fomos até o refeitório da Pinewood, coloquei a Clare em uma boa mesa e fui ficar na fila para pegar nossa refeição.  Lá estava cheio claro, e o como o local é muito elogiado, fiquei na fila bastante tempo (risos). E foi tempo suficiente para ter uma boa conversa com um cara mais velho com estilo de vestuário dos Tudors.  Acho que a BBC devia estar filmando algum drama e eles deveriam estar na hora do almoço. Conversamos detalhadamente e, de sua parte, extremamente séria, sobre os méritos relativos aos bifes e saladas oferecidos.

Lembro-me de ter arriscado uma opinião casual de que a salada Cobb deles estava muito boa, e ele agarrou meu braço (um aperto bastante impressionante, pelo que me lembro) e disse: "Sim! É bom! MUITO bom!" De qualquer forma, eventualmente fomos servidos, acenei me despedindo, e eu andei de volta para a mesa. E de repente Clare me agarrou pelo meu braço, não tão forte, mas intenso – e me encarando como se eu tivesse acabado de voltar de uma audiência com o Papa. "Meu Deus!" ela diz. "O que ele disse para você?" "Quem?" Eu perguntei, genuinamente intrigado, e ela me olha com uma mistura de inveja e desprezo incrédulo. "Charlton Heston!" ela diz. "Você acabou de passar cinco minutos conversando com Charlton Heston!" Bom, se eu tivesse percebido, poderia ter dito a ele para "tirar suas patas fedorentas de mim, o maldito macaco sujo."

6) Voltando para sua área de atuação. Qual trabalho que você fez que te deixou mais orgulhoso?

P.A.: Tenho lembranças muito felizes de praticamente todas as minhas experiências cinematográficas, mas provavelmente tenho mais orgulho dos meus livros e, se tivesse que destacar um, acho que seria minha coleção de contos, Rumors of the Marvelous. 

Em contrapartida, algum arrependimento?

P.A.: Arrependimentos? Acho que teria que dizer um filme que Tony Hickox e eu co-escrevemos nos anos 90 que acabou sendo produzido e lançado em 2013. Não me arrependo de trabalhar com Tony - fizemos muitos projetos juntos, todos do qual eu olho para trás com carinho - mas eu me arrependo do filme terrível que os produtores fizeram dele. Chama-se "O Despertar dos Deuses" e você deve evitar vê-lo a todo custo.

M.V.: (Risos) O diretor Roger Christian fez filmes marcantes da era do videocassete (Último detonador, Nostradamus e Marcação Cerrada) mas A Reconquista praticamente o redefiniu (que é muito ruim mesmo). Este que citou não conhecia, mas vou assistir com certeza.

7) Para finalizar, cite uma frase famosa do cinema que representa você.

P.A.: "Seu sofrimento será lendário, mesmo no Inferno."

M.V.: Obrigado amigo.

P.A.: Eu que agradeço a oportunidade.

 

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