Entrevista com Christian Petermann
Jornalista e crítico de cinema desde os 20 anos, já colaborou com veículos como a revista SET e o Guia da Folha de S. Paulo. Atualmente, é colaborador regular da revista Rolling Stone e do programa da TV Gazeta Todo Seu, curador do festival semestral Cine Vitrine Independente, consultor para a ONG CineMaterna e sócio-fundador da Abraccine (Associação Brasileira dos Críticos de Cinema).
Petermann é um daqueles críticos que todos reconhecem. É um dos 4 nomes que sempre lembrei, desde a minha juventude (Petermann e o Sadovski, ligados à revista SET, Ewald Filho dos guias e depois do Oscar e Wilson Cunha na Manchete).
E numa daquelas situações imprevisíveis da vida, eu o entrevistei poucos dias antes de falecer repentinamente, fazendo desta, sua última entrevista. Triste honra.
Confira abaixo as 7 perguntas capitais deste cinéfilo e crítico de cinema que vai deixar saudades.
1) Quando nasceu sua paixão pelo cinema? Houve aquele momento em que olhou para trás e pensou: sou cinéfilo !!??
C.P.: Surgiu naturalmente, desde cedo. Já sentia um fascínio muito grande ao acompanhar meus pais, nos anos 1970, para ver cada novo desenho da Disney e/ou filme dos Trapalhões. Adorava o ritual de entrar na sala, esperar com trilha sonora ambiente (lembro-me de, um dia, ter chorado ao ouvir a trilha de ‘Love Story’ sem sequer ter visto o filme à época), o escurecer das luzes, abrir das cortinas (sim, ainda havia cortinas à frente das telas, como no teatro!!!) e assistir ao filme. Aos 12 anos de idade, comuniquei aos meus pais que eu queria ser crítico de cinema e, a partir de então, tudo fiz para seguir neste caminho – leia-se, entre outras atitudes: assistir a todos os filmes possíveis, inclusive os “de arte”, que nem sempre compreendia enquanto pré-adolescente / adolescente.
2) Ser cinéfilo muitas vezes está atrelado ao colecionismo. Você coleciona filmes, cds ou algo relacionado à 7ª arte? Quem curte cinema, costuma ter suas relíquias em casa...
C.P.: Sim, desde sempre. Ainda tenho meus LPs e CDs de trilha sonora colecionados ao longo dos anos; guardei apenas uns 5 VHS importantes, mas ainda mantenho também minha coleção de DVDs; tenho pôsteres e cartões postais, livros de estudo / referência / fetiche e gadgets (estes sempre ganhos pelas distribuidoras, nunca comprados..). Muitas destas coleções fazem parte da decoração de meu apartamento, me fazem constante companhia.
3) Quando se tornou crítico de cinema? E como as portas se abriram para se tornar um dos principais críticos do nosso país?
C.P.: Tive a grande felicidade de conseguir meu primeiro emprego de carteira assinada como jornalista e crítico de cinema já aos 20 anos, no último ano da faculdade de Jornalismo. Fui o expert de cinema num semanário da área de home entertainment chamado “Video Home Jornal”, onde escrevia muito e a maioria dos textos. Agora no dia 10 de abril completo 30 anos desta contratação, 30 anos de crítica profissional!
A partir daí, foi um processo lento e gradual de me fazer conhecido entre imprensa e pessoas do mercado. Como denotava grande paixão pelo cinema e memória considerável, fui conquistando respeito e reconhecimento que me levaram a outros trabalhos. O auge desta primeira fase de minha carreira profissional foi a colaboração regular na revista SET, desde quase seu início, até atuar como editor assistente da mesma entre 1994 e 98 (pré-fase Roberto Sadovski).
4) Qual sua experiência, dentro deste universo artístico, foi mais importante para você?
C.P.: Um dos aspectos mais positivos de minha atividade como crítico é a interação, seja com cinéfilos que vem conversar comigo, ou alunos de meus cursos e oficinas que depois revelam ter sido influenciados / inspirados ou nas entrevistas que fiz com gentes de cinema. Três momentos que guardo com grande carinho na memória:
1º: em 1997, por ocasião da exibição de “Amateur” / Hal Hartley no Festival do Rio, entrevistei a grande Isabelle Huppert na cobertura de um hotel em Ipanema. Ruiva e de pele claríssima (como eu), a entrevista foi se movendo na medida em que o sol se movimentava ambos buscando sempre ficar na sombra; Huppert é um tanto seca no trato profissional, mas a entrevista foi muito boa.
2º: à época do lançamento de “Querô” / Carlos Cortez, entrevistei a talentosa Maria Luisa Mendonça no jardim de sua casa; ela tem / tinha muitos diferentes animais no espaço e, durante a conversa, suas duas calopsitas subiram pelos meus braços e ficaram a entrevista toda nos meus ombros, uma de cada lado, mordiscando minhas orelhas; fiz a ótima entrevista enquanto me arrepiava sem parar... (risos).
3º: no primeiro Festival Lume de Cinema, em São Luís/MA, coordenado pelo apaixonado Frederico Machado, assumi de improviso a mediação da conversa com a imprensa e crítica presentes do grande cineasta filipino Brillante Mendoza – foi uma experiência única! (aliás, falando em mediação, não posso esquecer-me da magnífica conversa que mediei numa Cinemateca Brasileira lotada com o ultra-simpático e inteligente ator Ricardo Darín).
C.P.: Listarei os filmes sem ordem de preferência, sem cronologia, apenas à medida que for lembrando dos títulos, ok?
Fama (quando era adolescente e jovem adulto), E.T., o Extraterrestre (quando era adolescente e jovem adulto), Contatos Imediatos do Terceiro Grau, Alien, o 8º Passageiro, O Desespero de Veronika Voss, E la Nave Va, O Bandido da Luz Vermelha, Laranja Mecânica, O Bebê de Rosemary, Veludo Azul, Sebastiane (Derek Jarman), O Despertar da Besta (Mojica), Beau Travail (Claire Denis). Afogando em Números (Greenaway), entre outros...
6) Fale um pouco dos seus próximos projetos. Tanto os que estão acontecendo quanto os previstos para começar.
C.P.: Continuarei a dar cursos, oficinas e palestras para compartilhar o meu prazer com a Sétima Arte: por exemplo, em junho, no Sesc Santana, um curso sobre Orson Welles; aguardo data para dar outro sobre Pier Paolo Pasolini no Sesc Pinheiros. Há outras atividades nesta área sendo formatadas ou em aguardo de confirmação. Pretendo retomar as atividades regulares como curador do festival Cine Vitrine Independente (em suspenso, no aguardo da aprovação de editais), e me envolverei também na curadoria da 6ª edição do festival PopPorn.
Continuarei viajando por alguns festivais de cinema no país como júri e/ou oficineiro – cumprirei as duas funções, por exemplo, no Curta Ourinhos que acontecerá agora em março. Investirei em minha visibilidade com o meu quadro semanal no programa Todo Seu / TV Gazeta SP, apresentado por Ronnie Von, além de finalmente formatar um programa meu online, talvez num canal do You Tube. E outras coisinhas mais...
7) E para finalizar, se pudesse deixar uma lição da sua vida dedicada ao cinema, qual seria?
C.P.: Assista de mente aberta, sem pré-conceitos, a todo e qualquer tipo de filme, pois cada obra cinematográfica tem a capacidade de nos ensinar algo, iluminar ideias, gerar epifanias, enfim, enriquecer – e muito! – cada espectador. Até mesmo um filme ruim tem muito a nos apresentar – e não só sobre a Arte em si, mas também sobre a própria vida.
M.V.: Obrigado amigo. Foi um prazer.